Procurando saber algo mais sobre os
encaixes de madeiras por meio dos nossos queridos marceneiros, encontrei por
meio do blog do Tomazelli que se diz um apaixonado por
madeira de verdade e marcenaria tradicional, um interessante post em que relata
por meio de um artigo o uso da espiga e fura para obter a união das peças de
madeira.
Espigas e seu uso
Texto adaptado por
Érica de Vargas
Esse artigo vai para aqueles que
gostam de marcenaria. É um pequeno artigo cujo conteúdo é muito comum de
ser encontrado em livros e revistas em inglês. Mas, como toda informação sobre
marcenaria, é algo raramente encontrado em português.
A espiga e fura é um dos métodos
mais usados para unir peças de madeira, é também um dos mais antigos, sendo
encontrado em sarcófagos do Egito. Primeiro vamos ver a nomenclatura das
partes do encaixe. Como não tenho nenhuma literatura em português, traduzi
livremente os termos usados em inglês.
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Figura
1: As partes de uma espiga |
A regra básica para as medidas de
uma espiga é de que a espessura dela deve ter em torno de um terço da espessura
da peça da fura. Se a espiga for mais fina, ficará fraca; enquanto que se a
espiga for mais grossa, as paredes laterais da fura ficarão fracas. Na prática
é uma questão de escolher a ferramenta que mais se aproxime dessa medida de um
terço: caso a fura seja feita a mão, o formão com largura mais próxima; caso
seja feita a máquina, a fresa ou broca mais próxima.
O comprimento da espiga tem uma regra
básica de ser pelo menos cinco vezes a espessura da espiga. Na prática, quanto
mais comprida a espiga mais resistência dará. Então, caso a espiga não seja
vazada, o ideal é fazer a fura o mais profunda possível, deixando ainda uma
sobra razoável de madeira do lado oposto a fura, para que não fique muito fraca
e quebre facilmente.
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Já a altura da espiga é um pouco
mais complicado. Geralmente ela não deve ser muito maior do que o comprimento,
pois caso fosse iria dar pouca resistência contra flexão. Uma alternativa caso
a espiga seja muito alta, é dividi-la em duas ou mais. Ou fazer uma espigahaunched,
com a espiga central comprida, e os haunchs em cima e em
baixo, que darão uma maior resistência contra torção, conforme a figura 2.
Lembrando que essas regras são um
ponto de partida, não uma verdade absoluta. Cabe ao marceneiro decidir as
medidas finais. Alguns projetos sofrem mais forças em um sentido do que em
outro, assim o marceneiro pode e deve estudar seu projeto, decidindo as medidas
ideais da espiga para dar mais resistência nesse ou naquele sentido.
Agora a nomenclatura da fura. Veja
que os nomes mudam da espiga para a fura, a altura da espiga equivale ao
comprimento da fura, enquanto a espessura da espiga equivale à largura da fura.
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Uma espiga deve entrar justa no
comprimento da fura, não em sua largura. Se entrar apertada na largura da fura,
ela pode abrir os veios da madeira. Já no comprimento da fura, a espiga
encontra a madeira da fura de topo, como está marcado na figura 3. Como a
espiga encontra a madeira de topo, não há perigo de abrir ou rachar a peça da
fura. Uma maneira de verificar se a espiga está entrando macia na largura
é inclinando a espiga, conforme a figura 4.
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Figura 4: Teste para verificar se a espessura da espiga está correta |
A espiga deve entrar facilmente na
fura dessa forma, apenas com a mão e sem ser necessário forçar. Porém não deve
entrar com folga, deve entrar macia, facilmente, mas deve haver uma sensação de
leve atrito. Já quando for encaixar a espiga totalmente, ela deve entrar
bem justa, sendo necessário força para entrar. Se entrar facilmente, apenas com
a mão, o encaixe está folgado.
O encaixe por si só já oferece
resistência contra compressão, cisalhamento, flexão e torção. A única força
contra a qual ele não oferece resistência é a tração, ou seja, ao ato de se
separar o encaixe. Porém, há variantes do encaixe que oferecem resistência
contra tração, além disso, a cola usada hoje em dia também oferece uma ótima
resistência contra tração.
FORÇAS QUE ATUAM SOBRE O ENCAIXE
Vamos ver um pouco sobre essas forças, ter uma noção geral
das forças é importante para poder entender alguns tipos de encaixes.
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Figura 5: Compressão |
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Figura 6: Cisalhamento |
Quem oferece resistência ao
cisalhamento são as faces da espiga. Quanto mais comprida a espiga, maior a
resistência.
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A
flexão é como o nome indica um movimento parecido com o flexionar de um braço.
É um movimento que tende a tirar as duas peças do esquadro. Quanto maior o
comprimento da espiga, maior a resistência contra a flexão.
Na
verdade, o que mais conta para dar resistência é a relação entre altura e
comprimento da espiga. Se a espiga for muito alta e pouco comprida, ela não irá
dar resistência contra flexão. Por isso quando o trabalho exige uma espiga
muito alta, é comum vermos duas espigas em vez de apenas uma, como já foi
comentado antes (figura 2).
A torção é um movimento de rotação
da peça da espiga no seu eixo longitudinal. Para resistir à torção, quanto mais
alta a espiga melhor.
A última força é a tração. Em uma
espiga simples, somente a cola oferece resistência contra tração. Felizmente na
maioria dos casos, por conta da disposição dos encaixes, a força de tração vai
ser pouca. Além disso, algumas variações oferecem resistência mecânica contra a
tração, como a espiga com cunha, espiga com cavilha, etc.
TIPOS DE ESPIGA
MAIS USADOS NA MARCENARIA
Espiga e
fura cega (Blind mortise and tenon)
É a mais comum das espigas, onde a
fura não atravessa para o outro lado, por isso chamada de espiga cega. Também é
chamada simplesmente de espiga.
Espiga haunched (Haunched
mortise and tenon)
Esse é um tipo de espiga usado
sempre na borda das peças. Se fôssemos fazer uma espiga normal no canto da peça,
ficaria uma quantidade pequena de madeira no topo da peça da fura. Com pouca
madeira no topo (Fig. 11) , qualquer esforço faria rachar o topo da peça da
fura.
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Uma alternativa é recuar a espiga,
deixando um pouco mais de madeira no topo da peça da fura (Fig. 12). Porém,
abaixando a espiga diminuímos sua altura e diminuímos junto a resistência
contra torção.
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Uma
alternativa melhor nesses casos é a espiga haunched (Fig. 13).
Essa espiga ainda mantém uma boa quantidade de madeira no topo da peça da fura,
para evitar rachar, e incorpora um pequeno segmento, o haunch, até
a borda de cima. Esse segmento extra vai conferir mais resistência contra
torção.
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Figura 13: Espiga haunched |
Esse tipo de espiga também é muito
usado na construção de painéis com moldura, onde as peças tem um rasgo interno
para encaixar o painel (Fig. 14). Assim podemos fazer o rasgo para o painel de
fora a fora nas peças, já que a espiga irá tampar esse rasgo.
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Outra variação ainda é essa, quando
não podemos ou não queremos que o segmento (haunch) apareça no topo
da peça. Em fez de deixar o seguimento reto, deixamos ele em ângulo (Fig.
15), assim por fora não irá aparecer nada. Esse encaixe oferece um pouco
menos de resistência contra torção.
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Espiga e
fura aberta (open mortise and tenon)
É uma espiga usada no canto da peça
também. A vantagem é que ela pode ser feita facilmente na serra de bancada. Por
ser totalmente aberta, não oferece resistência contra flexão e deve ser usada
com cautela, apenas em locais onde não haverá esforços de flexão. Uma cadeira,
por exemplo, sofre grande esforço de flexão quando encostamos no espaldar.
Para essa espiga aberta ter
resistência contra flexão, podemos colocar uma ou duas cavilhas, fazendo
uma espiga aberta com reforço de cavilhas, como vamos ver mais abaixo na
espiga com reforço de cavilha.
Espiga e fura vazada (through mortise and
tenon)
É a mesma coisa de uma espiga cega,
porém a espiga atravessa a peça totalmente. A vantagem é que a espiga é mais
comprida, oferecendo maior resistência.
Espiga e
fura vazada com cunha (wedged through mortise and tenon)
É uma variação da espiga vazada. A
diferença é que a parte de fora da fura é inclinada, um pouco mais aberta, e a
espiga recebe dois cortes por onde serão inseridas duas cunhas.
A figura 19 mostra o detalhe de como
a fura é levemente inclinada na parte de fora. Assim quando as cunhas forem
inseridas, irão fazer com que a espiga abra, formando uma espécie de rabo de
andorinha dentro da fura. Os dois furos na espiga, no final dos cortes, servem
para que a espiga não rache quando inserirmos as cunhas.
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Boa tarde,
ResponderExcluirSeu artigo esta me ajudando muito com meu tcc onde planejo cria um sofá feito apenas com encaixes
Obrigado pelo conteúdo
Abraço
Muito útil. Obrigado
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